29.1.14

Defesa dos Animais



Defesa animal: o pioneirismo do jornal vilafranquense “O Autonómico” (1)

Fundado por António Rodrigues Carroça, o semanário “O Autonómico”, que se publicou em Vila Franca do Campo, entre 1898 e 1943, foi um jornal que no que respeita à questão animal esteve à frente do seu tempo, de tal modo que a grande maioria dos textos que sobre o assunto publicou ainda hoje não perdeu atualidade.
A maioria dos textos sobre a proteção animal surgidos naquele jornal vilafranquense era da autoria de Luís Leitão, também colaborador de Alice Moderno no seu jornal “A Folha”, cidadão que ao longo da sua vida combateu o crime, a guerra, o alcoolismo e a tauromaquia e se bateu pelos direitos das crianças e dos animais e propagandeou o feminismo e o vegetarianismo.
Num texto, não assinado, intitulado “As Aves”, o autor, depois de condenar o costume de “meter aves em gaiolas”, apresenta alguns conselhos sobre as condições a que devem obedecer as mesmas com vista à manutenção das aves nas melhores condições possíveis e como forma de “lhes adoçar as agruras do cárcere, que não merecem, visto que não cometeram nenhum crime ou falta”.
Ainda no mesmo texto, publicado a 5 de Junho de 1937, o autor recomenda a quem tem pássaros engaiolados que após a morte destes não os substituam por outros adquiridos para o mesmo fim e termina o seu texto com várias quadras ilustrativas do seu pensamento sobre o assunto.
A título de exemplo, a seguir, apresenta-se duas delas:
Deus não me deu asas
Para viver em prisão
Foi p´ra voar, para amar
Dos espaços a amplidão

Sofro contudo um castigo
Injusto porque mal não fiz.
A falta de Amor nos homens,
Ai de mim, assim o quis.
Outro colaborador do jornal foi o jornalista e dramaturgo José Fontana da Silveira (1891-1974), autor de diversas obras de carácter didático destinadas às crianças, que, em 1914, escreveu: "Mentem todos os que afirmem que os animais nasceram para servir de sustento ao homem ou para servirem de nossos escravos… Se assim fosse teríamos de aceitar como perfeitamente lógica a asserção, condenada atualmente, de que a exploração do homem pelo homem é uma coisa imprescindível e que existe todo o direito do homem sacrificar os seus semelhantes, visto que, como os animais, nós possuímos inteligência, vida, perceção, e somos também sensíveis ao sofrimento."
A 12 de Março de 1938, Fontana da Silveira publicou um artigo sobre as abelhas. No referido texto, para além de mencionar que as mesmas têm uma grande importância para o aumento da produção das fruteiras e de “nem prejudicarem em coisa alguma” cita Materlink que “afirmou ser difícil encontrar uma república humana cujo plano abrace uma porção considerável dos desejos do nosso planeta; uma democracia em que a independência seja ao mesmo tempo mais perfeita e mais racional, e a vassalagem mais inteligente”.
A 20 de Maio de 1939, num texto intitulado Cemitério de Cães, Fontana da Silveira relata o episódio de um cão que salvou 41 pessoas que estavam perdidas na neve e que acabou por ser alvo de reconhecimento. No mesmo texto, o autor refere a existência, em Paris, de um cemitério para cães, onde entre outros num epitáfio é mencionado o facto de um cão ter salvado uma criança que se encontrava prestes a morrer afogada.
Por último, J. Fontana da Silveira refere-se ao facto das “manifestações de gratidão e apreço pelos animais” dizerem “muito para quem souber compreender e, principalmente, SENTIR”.
Hoje, na nossa sociedade da “abundância”, pelo menos para alguns, o que mais abunda é a falta de sentimento (e de compaixão) não só para com os animais ditos irracionais mas também para com os humanos.
Teófilo Braga

(Correio dos Açores, nº3007, 29 de Janeiro de 2014, p.16)

22.1.14

Um breve olhar sobre o movimento animalista nos Açores


Um breve olhar sobre o movimento animalista nos Açores

O movimento animalista pode ser definido como uma nebulosa de associações formais ou informais que defendem os direitos dos animais e que pugnam pelo seu tratamento ético na sociedade.
Para a consecução dos seus fins, as diversas organizações recorrem a diferentes meios, como manifestações, petições, sabotagens, boicotes, ações de sensibilização, etc., conducentes a, por um lado, mudar a legislação em vigor e, por outro, promover uma alteração das atitudes e comportamentos das pessoas face aos animais.
Minoritárias, pelo menos atualmente, são as associações que responsabilizam o atual modo de produção e de consumo pelo sofrimento infligido aos animais pelo que consideram que a luta pela libertação animal não é uma luta desligada das outras. Assim, defendem a interligação entre a libertação animal, a humana e a da Terra.
Outra corrente, também minoritária mas em expansão, é a que combate o especismo, isto é a descriminação de um indivíduo em função da espécie. Para os antiespecistas o objetivo comum é “a abolição da matança e exploração de animais conforme já acontece com os seres humanos”.
Nos Açores, as primeiras associações de proteção dos animais surgiram no início do século passado. Assim, em 1911, foi criada em Angra do Heroísmo a SPAAH - Sociedade Protetora dos Animais de Angra do Heroísmo, instituição que tinha por fim, de acordo como art. 1 dos seus estatutos, “proteger dos maus tratos todos os animais não considerados daninhos… e animar o exercício da caridade para com os animais, estabelecendo para isso prémios e recompensas sempre que permitam os recursos da sociedade” e a Sociedade Micaelense Protetora dos Animais que tinha como “fim melhorar por todos os meios ao seu alcance a sorte dos animais e conferir prémios a quem por qualquer forma se distinguir pela compaixão e bom tratamento para os mesmos, punir os que maltratarem e estabelecer um Lazareto para tratamento dos animais achados quando abandonados pelo dono”.
De então para cá algumas associações se criaram, especialmente dedicadas à proteção dos animais de companhia, com destaque para os cães, mas sem descurarem os gatos.
Para além das referidas associações, que têm uma atuação fortemente assistencialista, têm, também, surgido alguns coletivos de proteção dos animais, mais ou menos voláteis, com atuações essencialmente cívicas, destacando-se de entre eles um coletivo abolicionista da tauromaquia.
Nos últimos tempos, aproveitando as potencialidades das redes sociais têm proliferado as páginas e grupos de defesa dos animais, nomeadamente dos de companhia, e de oposição às touradas.
Ao contrário da maioria outros movimentos existentes na nossa sociedade cuja expansão estagnou e a sua atividade sofreu um forte declínio, não mencionando aqui os grupos caritativos cujo aparecimento é, do nosso ponto de vista, conjuntural, o movimento animalista, embora ainda muito débil, é o que maiores potencialidades tem de crescimento.
O movimento animalista se quiser vir a influenciar a sociedade açoriana terá de estar consciente de todos os obstáculos que terá de enfrentar, como as tradições retrógradas que não fazem sentido quando estão associadas ao sofrimento animal ou a legislação existente que ou “beneficia” os infratores ou que por si só não impede a violação dos direitos dos animais. Por exemplo, não é por existir legislação relativa à proteção do ambiente que os crimes ambientais deixaram de ocorrer ou a existência de legislação relativa aos direitos humanos não levou ao desaparecimento da violação dos referidos direitos. Em relação aos animais a situação é (será?) semelhante. Ainda em relação aos animais, não é absurdo que haja legislação que puna o mau trato quando o animal é um cão e não o faça quando o mesmo for um bovino?
Por último, os ativistas dos direitos dos animais têm de ter uma atuação que evite darem tiros nos pés, como acontece muitas vezes. Para tal, Henry Spira, que é o “pai do selo “não testado em animais" recomenda que o ativista:
- Tente compreender o pensamento do público e não se isole da realidade;
- Não divida o mundo entre santos e pecadores;
- Procure o diálogo e tente trabalhar, na medida do possível, em conjunto com seu oponente para encontrar soluções.

Teófilo Braga

(Correio dos Açores, nº 3002, 22 de Janeiro de 2014 p.16)

18.1.14

Proteste contra a tortura



APELO 

Não mais dinheiros públicos para as Touradas.
Não fique indiferente- Entre em ação

Nos próximos dias 24, 25 e 26 de Janeira vai realizar-se o “III Fórum da cultura taurina”, em Angra do Heroísmo, Ilha Terceira (Açores)

Escreva um e-mail aos governantes, deputados e autarcas dos Açores e aos patrocinadores.

Pode usar o texto abaixo ou personalizá-lo a seu gosto.






Exma. Senhora
Presidente da Assembleia Legislativa Regional dos Açores
 Exmo. Senhor
Presidente do Governo Regional dos Açores
 Exmos (as) Senhores (as)
Deputados (as) da Assembleia Legislativa Regional dos Açores
Exmos Senhores
Presidentes da Câmara Municipal de Angra do Heroísmo e da Câmara Municipal da Praia da Vitória
Exmos  Senhores Patrocinadores


Mais dinheiro público para a tortura animal nos Açores


A avultada quantia de 90.000 euros é o dinheiro que vai custar aos açorianos a realização do chamado “III Fórum da cultura taurina” de 24 a 26 de Janeiro na ilha Terceira, sendo 60.000 euros diretamente aportados pelo governo açoriano e o restante pelas autarquias terceirenses e outros apoios. Num momento em que não há dinheiro para nada que seja a favor da vida, da saúde ou da educação dos açorianos, há sempre dinheiro público para financiar escuros congressos sobre uma prática, a tauromaquia, progressivamente rejeitada por todas as sociedades civilizadas e que nada de bom traz para a região.

Mais questionável ainda é o financiamento público deste evento quando na sua anterior edição, há dois anos, esse mesmo dinheiro público foi utilizado pelos organizadores para realizar, à vista de todos, um espetáculo com sorte de varas, prática de tortura proibida em Portugal e expressamente rejeitada pela Assembleia Regional. A realização deste ato ilegal, que ficou impune apesar dos vários protestos realizados dentro da própria Assembleia Regional, não mereceu nenhum tipo de desculpa por parte dos organizadores nem nenhuma explicação por parte do governo regional. Dois anos depois, o governo volta a financiar e premiar com dinheiro público os mesmos organizadores, se calhar para a realização dos mesmos fins.

Não deixa também de ser chocante que este evento seja apoiado pela Secretaria Regional do Turismo, quando a prática da tortura animal é totalmente incompatível com a promoção turística da região como um destino de turismo verde e de natureza. Não podemos esquecer que, por exemplo, no verão passado um grupo de cerca de 85 turistas alemães cancelou a sua vinda aos Açores depois de ver imagens de touradas realizadas na ilha Terceira. Assim, a Secretaria parece estar a utilizar dinheiros públicos para destruir a sua própria política de promoção turística.

Da parte dos organizadores do evento, da Tertúlia Tauromáquica, ouvimos declarações delirantes como dizer que a defesa da tauromaquia inclui valores ecológicos, culturais, sociais, educativos, solidários e económicos. Deveriam antes falar do ecológico que é a ocupação de zonas da Rede Natura 2000 para a criação do gado utilizado nas touradas. Deveriam falar do educativo que é obrigar as crianças a ver animais a ser torturados em espetáculos de sangue e violência contra touros e cavalos. Deveriam falar de solidariedade às famílias das pessoas que são feridas ou mortas cada ano nas touradas. Deveriam falar dos mais de 580.000 euros de fundos públicos que são gastos anualmente na tauromaquia nos Açores. Como exemplo temos o orçamento da câmara de Angra do Heroísmo para 2014, que vai gastar 125.000 euros só numa feira taurina, quando em todo o ano gastará apenas 52.000 euros em ação social.

Por todas estas razões, a realização deste evento vergonhoso para os Açores deveria ser cancelado e o dinheiro público ser bem gasto na realização de políticas que beneficiem realmente as famílias açorianas.


Cumprimentos

8.1.14

Alice Moderno vai ser respeitada?



A VONTADE DE ALICE MODERNO VAI SER RESPEITADA?

1-   O bem-estar animal e o controlo das populações de animais errantes

Foi com muita satisfação que recebi a notícia da aprovação, por maioria, pela Assembleia Legislativa Regional dos Açores, no passado dia 10 de Dezembro, de uma resolução que visa a promoção do bem-estar animal e o controlo das populações de animais errantes.

Se estão de parabéns todos os deputados que aprovaram a resolução, bem como todas as entidades que emitiram os seus pareceres favoráveis, como o Clube dos Amigos e Defensores do Património Cultural e Natural de Santa Maria e a APA- Associação Açoriana de Proteção dos Animais, lamenta-se o silêncio, embora possa haver justificações fortes para tal, de outras associações de proteção dos animais.

Embora respeitável, já que todos têm direito à sua opinião, considero lastimável o parecer da Delegação dos Açores da Ordem dos Médicos Veterinários, pois emite opiniões sobre um texto treslido.

Não deixando de ser extremamente positiva a aprovação da resolução, tenho sérias dúvidas acerca da sua implementação já que há sempre alguém apostado em puxar para trás, em tentar impedir a evolução das sociedades.

Não vou aqui rebater os vários argumentos contra a resolução, apenas mencionei o dos custos da implementação de uma política de não abate que é recomendada por várias organizações internacionais.

Por acaso, já alguém apresentou algum estudo com os custos do abate sistemático e da incineração dos milhares de animais mortos nos canis, licenciados ou não, nas diferentes ilhas dos Açores e que nunca pararão já que sem esterilizações os animais continuarão a procriar-se?

Temos dúvidas se o farão, pois o que é chique é fomentar o consumo, o usar e deitar fora e, no caso em apreço, é comprar e oferecer animais pelas festas ou aniversários para os abandonar à primeira oportunidade.

2-   Por que razão aderi à causa animal?

Há algum tempo, estou em crer que em jeito de brincadeira, alguém escreveu numa conhecida rede social que não podia contar comigo pois eu era amigo dos animais e não dos humanos.
Como não tenho que dar provas de nada e como cada um tem a liberdade de escrever o que lhe vai na alma, apenas aproveito para enumerar algumas razões que me motivam a lutar pelos direitos dos animais e que são, em síntese, as seguintes:
1-      Porque ninguém sensível poderá ficar indiferente, no caso dos animais de companhia, à barbaridade que consiste no abate, anualmente, de 100 mil animais em Portugal nos canis municipais, resultado de compras irrefletidas, de adoções irresponsáveis, de falta de compaixão e de políticas erradas;

2-      Porque não é incompatível o envolvimento na causa animal com a adesão a todas as outras. Quem contribui com o seu trabalho voluntário ou monetariamente para a proteção dos animais não está impedido de o fazer para outras causas, como o combate à fome no mundo ou na nossa terra, o apoio aos idosos ou aos sem-abrigo, etc..

3-      Porque, como muito bem escreveu Alice Moderno, “Caridade não é apenas a que se exerce de homem para homem: é a que abrange todos os seres da Criação, visto que a sua qualidade de inferiores não lhes tira o direito aos mesmos sentimentos de piedade e de justiça que prodigalizamos aos nossos semelhantes”.

4-      Finalmente, porque, como muito bem escreveu Álvaro Múnera, antigo toureiro colombiano que, arrependido, passou a dedicar-se à defesa animal: “os animais vivem um absoluto inferno por culpa do beneficiário de noventa e nove por cento das causas existentes, o ser humano”.
Teófilo Braga

(Correio dos Açores, nº 2992, 9 de Janeiro de 2014, p.13)